Hoje, 17 de junho, foi instituído pela Organização das Nações Unidas –ONU como o Dia Mundial de Combate à Desertificação e à Seca. Um dia para olhar para o nosso território como espaço de convivência e para refletir sobre como podemos ser agentes de mudança fazendo uso de alternativas para minimizar os efeitos desse fenômeno que avança a cada ano.
O Serta, por meio do curso de agroecologia e ações de Assistência Técnica e Extensão Rural – ATER, tem se dedicado ao combate à desertificação e à seca, especialmente na região do Semiárido brasileiro, onde do total de 982.563 km2 da área, 600 mil km2 já foram gravemente atingidos. Nos últimos dez anos, o desmatamento da Caatinga atingiu uma área equivalente ao tamanho de Portugal. Mas o que tem causado esse acentuado processo de desmatamento que tem acelerado a desertificação e por que é necessário reverter esse quadro?
O termo desertificação remete ao fenômeno que corresponde ao empobrecimento e diminuição da umidade em solos arenosos, localizados em regiões de clima subúmido, árido e Semiárido, que inviabiliza a prática da agricultura pela perca da capacidade produtiva, escassez de água e infertilidade do solo.
O assunto é abordado durante toda formação do curso técnico em Agroecologia do Serta, na transversalidade das disciplinas, a partir das realidades e dos resgates históricos dos estudantes, à luz da metodologia PEADS. Os estudos apontam alternativas, já praticadas por estudantes, que têm contribuído na conscientização de comunidades, na recuperação de matas ciliares e nascentes, e ajudado no combate à desertificação e escassez de água.
Os quintais produtivos e os Sistemas Agroflorestais – SAF são essenciais para a produção responsável de alimentos. Eles permitem maior diversificação da produção, proteção do solo, aumento da ciclagem, disponibilidade de alimentos, melhora a qualidade do alimento em função da não utilização de agrotóxicos e ainda auxilia na segurança alimentar do rebanho. No caso do SAF, favorece a recuperação da produtividade de solos degradados através de espécies arbóreas implantadas.
No município de Panelas, o técnico de agroecologia do Serta José Everaldo conseguiu recuperar nascentes por meio do reflorestamento da propriedade de dois hectares, controlando a erosão, melhorando as condições geoambientais, estimulando à apicultura, aumentando os recursos hídricos, contribuindo significativamente para a redução do efeito estufa. “Com a escassez da água na propriedade, criei o Projeto Mata Viva. Plantei mais de dez mil árvores e tenho mais de cinco mil mudas que serão plantadas no entorno da nascente”, conta .
As tecnologias sociais do barreiro trincheira e da cisterna calçadão armazenam água da chuva para uso animal e para a produção de legumes e frutas para alimentação familiar, garantindo a soberania e segurança alimentar e nutricional.O calçadão, além de aparar água da chuva, serve para secagem de grãos como o feijão e milho e para outros usos.
Para o educador do Serta Tião Alves, a educação ambiental contextualizada é fundamental para efetivação de ações protetoras. “A educação ainda passa muito longe pelo contexto da preservação ambiental, não permitindo um currículo que abranja a problemática local como objeto de estudo para as transformações que as circunstancias exigem”, considera.
Essa falta de orientação e capacitação das populações para o uso adequado dos recursos pode exterminar espécies importantes para economia e preservação ambiental e conservação da biodiversidade. “O uso inadequado da vegetação tanto na exploração das espécies para produção de carvão vegetal e cosméticos, etc., tanto no planejamento ineficiente da criação de animais, em especial aos caprinos, aumentam as chances de tornar o ambiente degradado”.
Erica Priscila, técnica em Agroecologia pelo Serta, mora no Assentamento Lameirão, município de Delmiro Gouveia, alto sertão alagoano. Os conhecimentos adquiridos no curso e as práticas que desenvolve a partir da experiência com o Serta fez com que a jovem criasse o Programa Eco no Ar, na rádio comunitária Alternativa 98.5, como meio de educar a população local para questões ambientais.
“No programa tratamos do meio ambiente, da natureza, caatinga e agricultura familiar, das problemáticas locais, e também oferecemos dicas técnicas de como cuidar e preservar o solo. Paralelo ao Programa temos as ações práticas, onde construímos o quintal produtivo Veredas da Caatinga, com produtos orgânicos de base agroecológica, e o SAF, com plantio de árvores nativas”, conta Erica.
A estudante de agroecologia do Serta Valquíria Pereira, da Comunidade Caiana, Várzea Alegre, região do Cariri, Ceará, interrompeu uma prática bastante comum no lugar: as queimadas de matéria orgânica. Com os aprendizados do curso, passou a investir na propriedade. Dois hectares é a área de preservação que a estudante tem se dedicado para reflorestar, mantendo a matéria orgânica no chão, plantando novas árvores no SAF que iniciou. A agricultora revela que já produz seu próprio adubo natural através da compostagem e que implementou um bioágua com uso de tonéis de plástico, que fazem o tratamento de águas do uso doméstico.
Em Buíque/PE, na comunidade Boa Vista, hortas verticais, sofá de garrafa PET e sistema de aquaponia são algumas das ecotecologias reaplicadas na propriedade de Jear Pereira, que também estuda agroecologia no Serta. “Um dos principais aprendizados foi na questão da conservação do solo, onde passei a utilizar o defensivo biológico para não agredir a terra”, conta.
Outro obstáculo que impede preservação do bioma está na ineficiência de políticas públicas. Para Tião, “o uso das riquezas naturais em parcimônia com a política de estado, e a falta de reconhecimento das inúmeras potencialidades da caatinga para outros usos não convencionais, atrasam, deterioram e fomentam atividades degradadoras, ou em nome do desenvolvimento ou em nome da sobrevivência”.
O educador alerta que algumas atividades desenvolvidas no bioma, como a agricultura e pecuária, apresentam altos índices de incidência no processo de desertificação já instalado no território. “Evidentemente que algumas partes se apresentam mais acentuadas, como é o caso da região do Araripe, por comportar também as prerrogativas da indústria. Isso ocorre em praticamente todos os estados do Semiárido brasileiro”.
O educador atenta ao não cumprimento ou fragilidade da legislação, “para a manutenção das matas ciliares de rios, córregos, riachos e outros corpos d’água, do respeito as reservas legais e a preservação de espécies ameaçadas para que sejam efetivamente incorporadas ao cotidiano das pessoas”.
E alerta: “Se não reflorestarmos o Semiárido, sairemos da condição de semiaridez para a classe de aridez. Nessa classe o Semiárido já apresenta um índice em torno de 13%, e a cada dia surgem novas áreas susceptíveis acendendo o alerta de que se faz urgente o replantio, caso queiramos continuar a habitar e a desfrutar das riquezas, belezas e oportunidades da terra que nos viu nascer, da terra que é nossa, da terra que somos e fazemos parte dela”.
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